Na capital federal, a pouco mais de 40 quilômetros do Palácio da Alvorada, residência oficial da Presidência da República, está a maior favela da America Latina, com 78.912 moradores. A região, conhecida como Aris (Área de Regularização de Interesse Social) Sol Nascente, estava em segundo lugar até agosto deste ano, mas segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), em setembro o local desbancou a famosa "Rocinha", no Rio de Janeiro, que tem 69.161 habitantes, e passou a liderar o ranking.
Apesar de ficar em Ceilândia (DF), a situação da favela junto ao Estado ainda não está totalmente regularizada. Por isso, a população não tem infraestrutura e sofre com a ausência de serviços públicos como saneamento básico, saúde, segurança, educação e coleta de lixo. Nas ruas da cidade, que começou como uma ocupação há pouco mais de uma década, o esgoto corre a céu aberto na porta das casas dos moradores, que são obrigados a conviver com poeira e sujeira.
Bocas de fumo e áreas usadas como desova de veículos roubados que foram desmanchados se misturam aos cenários residenciais, onde crianças brincam e famílias inteiras lutam pelo apoio estatal. O comerciante Geraldo Araújo Paula, de 47 anos, mora no Sol Nascente há oito anos e disse que lá é um dos "piores lugares para se viver". Ele explicou que as autoridades só dão atenção ao local nas vésperas das eleições, mas garantiu que nenhuma das promessas feitas até hoje foi cumprida.
— Há três anos decidi montar meu mercado e já vi de tudo. A gente não tem polícia, bombeiro não vem aqui, segurança zero. Para pegar ônibus é preciso andar de 20 a 30 minutos até chegar na parada mais próxima e as ruas são estreitas, esburacadas e recebem todo o esgoto do "P" Norte. Quando é época de eleição os políticos aparecem com várias frases e planos bonitos, mas fica só na teoria.
O comerciante explicou que o tráfico de drogas, a violência e a briga entre gangues rivais dominam a população durante as "24 horas do dia". Para ele, até "a polícia tem medo de aparecer".
— Direto vejo gente morrendo, acerto de contas e muitas vítimas inocentes. Quando a gente chama a polícia ou os bombeiros eles levam horas para chegar e quando aparecem já está tudo feito, parece que é proposital. O trabalho de prevenção deles não acontece simplesmente porque a própria polícia tem medo de brigar com os bandidos daqui. Para morrer nessas ruas basta estar vivo. Aqui é o lugar errado e constantemente, pelo simples fato de estar caminhando para ir pegar um ônibus, por exemplo, pode ser a hora errada. Com essa combinação não dá em outra, é morte na certa.
Os dados do IBGE mostram que o número de moradores na região aumentou em relação ao último censo, realizado em 2010, quando a população era de 56.483 pessoas. Com a nova marca, o Distrito Federal passa a ter a maior favela da América Latina.
Apesar dos dados desfavoráveis, o motorista de ônibus Salatiel Mendes, 41 anos, disse que não há muito o que se comemorar. Ele contou que existem pontos de tráfico em toda a favela e que tem medo constante de morrer ou ter a casa invadida.
Mendes relatou que há pouco tempo o imóvel onde mora com a família foi arrombado pelos traficantes, que furtaram vários produtos e provocaram um prejuízo de R$ 4 mil. No momento em que tudo aconteceu, à luz do dia, ele e a mulher estavam no trabalho e o filho na escola.
— Moro aqui há cinco anos e acho ridículo viver na maior favela da América Latina. As autoridades devem se preocupar em fazer a melhor Educação, Saúde e Segurança do mundo. Aqui para ficar péssimo tem que melhorar muito, muito mesmo.
Mendes trabalha como motorista de ônibus e faz linha entre Ceilândia e Taguatinga. Durante a entrevista, ele confirmou que a população não tem transporte público de qualidade e precisa andar quilômetros para chegar aos pontos de ônibus mais próximos.
— Ônibus nenhum entra aqui, só passavam na avenida principal que fica bem distante. Quem depende de ônibus, precisa andar de quatro a seis quilômetros todos os dias para conseguir chegar na parada, pegar o coletivo e no caminho ainda corre risco de morte ou assaltado.
A Codeplan (Companhia de Planejamento do Distrito Federal) também divulgou um estudo que reafirma o crescimento populacional na região. Segundo o Pdad (Pesquisa Distrital por Amostra de Domicílios), os condomínios Sol Nascente e Pôr do Sol, ambos em Ceilândia, têm os piores indicadores de infraestrutura de todo o Distrito Federal.
O presidente da companhia, Júlio Miragaya, informou que apenas 6,1% do total das residências destas duas regiões possuem ligações com as redes de esgoto. Mais da metade da comunidade, 54,15%, não tem serviço de limpeza urbana e 94% das ruas estão sem pavimentação.
— O que chama a atenção é o tamanho da área. A população é muito maior que a de outros bairros populares. A Estrutural, por exemplo, tem somente 30 mil habitantes. Acredito que o fato de essas ocupações serem mais recentes, o Estado ainda não conseguiu chegar em todos os pontos. A situação de infraestrutura deles é muito ruim e a demanda muito grande.
Procurada pela reportagem do R7 para comentar sobre a questão de lixo espalhado pelas ruas do Sol Nascente, o SLU (Serviço de Limpeza Urbana) afirmou que esta é uma reclamação recorrente e garantiu que o lixo é recolhido todos os dias na região, e que os moradores colocam novos sacos nas ruas fora do horário de coleta. A empresa também garantiu que os funcionários fazem periodicamente mutirões de limpeza, mas que precisa da ajuda da comunidade para evitar transtornos.
Em nota, a Sedhab (Secretaria de Desenvolvimento Habitacional do DF) informou que o GDF começou a avançar nas negociações, em parceria com a Codhab, no processo de regularização do Setor Habitacional Sol Nascente. A secretaria destacou esse propósito como "prioridade do governo atual" uma vez que existem recursos do Governo Federal e do governo local para serem aplicados nas melhorias necessárias para esta comunidade.
Ao todo, serão investidos no Setor Sol Nascente quase R$ 220 milhões para realização de obras de infraestrutura como a implantação de asfalto, rede de drenagem e previsão de construção de mais de duas mil casas.
A secretaria explicou que para amenizar o problema, o GDF está fazendo a abertura das vias, a pavimentação em caráter emergencial e instalando iluminação pública em toda a cidade, além de construir praças e parques com equipamentos comunitários e urbanos.
Com essa regularização, a pasta acredita que todas as famílias passarão a morar em área legal, com direito a escritura definitiva do imóvel e investimentos constantes do Estado no que diz respeito a Saúde, Educação, Segurança e Lazer.
R7
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